A Pirataria Marítima e os Assaltos à Mão Armada Contra Navios[1] (AMACN) continuam a não dar tréguas à navegação mercante nas águas do Golfo da Guiné.
Em menos de um mês dois navios de bandeira portuguesa foram alvo de ataques piratas nesta região. O primeiro deles, o navio porta-contentores, de 139 m de comprimento, MSC TALIA F[2] foi atacado no dia 22 de março de 2020. Encontrava-se a cerca de 62 mi a oés-noroeste de Libreville, a capital do Gabão, para onde se dirigia. Os piratas entraram a bordo e raptaram 7 dos seus 17 tripulantes.


Em 19 de abril de 2020, foi atacado o porta-contentores TOMMI RITSCHER[3], de 256 m de comprimento, que se encontrava fundeado ao largo da cidade de Cotonu, capital do Benim. Durante o ataque, oito dos seus 19 tripulantes desapareceram — provavelmente foram raptados — enquanto os restantes se fecharam na cidadela[4].


Este é o atual modus operandi dos piratas no Golfo da Guiné, ou seja, raptam os marítimos para depois poderem obter quantias elevadas pelo seu resgate.
Ambos os navios estão registados no Registo Internacional de Navios da Madeira (MAR), que já é atualmente um dos maiores da Europa. Em 15 de fevereiro de 2020 estavam inscritos neste mais de 560 navios mercantes e 118 embarcações de recreio.

O Portuguese Navy Shipping Centre (PNSC) uma ferramenta essencial para apoiar a navegação mercante em áreas perigosas.
Tendo presente o quantitativo de navios registados em Portugal e o problema que constitui para todos eles, em termos de segurança, a passagem por áreas onde existe pirataria marítima e/ou AMACN, a Marinha Portuguesa criou há cerca de 2 anos, o Portuguese Navy Shipping Centre (PNSC). Este encontra-se instalado no Comando Naval, no Centro de Operações Marítimas (COMAR), onde funciona também o Maritime Rescue Coordination Centre[5] (MRCC) de Lisboa. A ação do PNSC é exercida através de uma célula de acompanhamento, aconselhamento e defesa da navegação mercante e lúdica de bandeira nacional. Esta está disponível 24 horas por dia e 7 dias por semana.
Este Centro monitoriza um vasto leque de ameaças, convencionais e assimétricas, entre as quais se inclui a pirataria marítima e os AMACN. Produz e divulga relatórios semanais, trimestrais e anuais, bem como, avisos e alertas sempre que a segurança marítima assim o exige. Segundo o Relatório Anual do PNSC registaram-se o ano passado 157 casos de pirataria e AMACN nas águas da região do Golfo da Guiné, dos quais 89 na Nigéria, 12 nos Camarões, 10 no Gabão e os restantes 46 noutros 13 países.

A presença de meios navais portugueses no Golfo da Guiné
Portugal tem-se mantido muito ativo no combate à pirataria marítima e aos AMACN desde 2009, altura em começou a participar com as suas Forças Armadas em várias operações na região do “Corno de África”. A Marinha portuguesa já ali esteve presente, com meios navais, por seis vezes. Nos últimos anos Portugal tem estado mais focado na região do Golfo da Guiné, onde tem participado com as suas Forças Armadas, nomeadamente com a Marinha, em vários exercícios e operações de combate à pirataria marítima e aos AMACN.


A proteção armada a bordo dos navios mercantes
Em termos legislativos Portugal fez também aprovar um importante diploma legal para o combate a este tipo de ilícitos. Trata-se do Decreto-Lei n.º 159/2019, de 24 de outubro, da Presidência do Conselho de Ministros, o qual
… aprova um regime jurídico do exercício da atividade de segurança privada armada a bordo de navios que arvorem bandeira portuguesa e que atravessem áreas de alto risco de pirataria.
Este Decreto-Lei para além de permitir aos armadores, caso queiram, poder ter segurança armada a bordo, aumentando assim a segurança dos seus navios, irá contribuir certamente para o aumento do número de registos no MAR, pois este fator é determinante para muitos armadores quando têm de escolher o local de registo dos seus navios.
Contudo, para que tudo isto se possa operacionalizar falta ainda a regulamentação do Decreto-Lei n.º 159/2019, a qual já deveria ter ocorrido.

Nota da redação: Recentemente, em declarações ao jornal Diário de Notícias da Madeira, o administrador executivo da SDM, Roy Garibaldi, afirmou que
o facto de um dos navios pirateados pertencer à MSC, o segundo maior armador mundial, não abona em favor de Portugal”
e mais,
a SDM sabe que a MSC planeava aumentar a sua frota no MAR e que, neste momento, está a reequacionar tudo”.
Acrescentou ainda que
“há um risco comprovado de navios e sociedades de shipping registadas na Madeira de deixarem Portugal, prejudicando obviamente a imagem que o País vinha conquistando no universo do shipping no plano internacional.”
Fonte: DNotícias – Menos de 40 dias para armar navios
Notas:
[1] Atos ilícitos idênticos aos da pirataria, só que cometidos no mar territorial ou em águas interiores. O mar territorial consiste numa zona marítima, sob soberania nacional, que vai até às 12 mi, contadas a partir da “linha de costa” (linha de base reta ou normal) de um Estado. Uma milha náutica são 1.852 metros.
[2] IMO: 9308601.
[3] IMO: 9656137.
[4] É a designação dada ao compartimento do navio criado propositadamente para proteger a tripulação de um ataque pirata, refugiando-se esta no seu interior sempre que esse ocorra.
[5] Designado em português por Centro de Coordenação de Busca e Salvamento Marítimo de Lisboa.